Caso Paquetá e investigações corporativas

Em recente publicação do portal ge.globo.com, em matéria intitulada como “Aposta casada e movimentação incomum no Rio”, o conteúdo desperta um ‘alerta vermelho’ para investigar Lucas Paquetá. O jornalista Cahê Mota descreve como as autoridades responsáveis pelo monitoramento de sites de apostas esportivas, bem como a Federação Inglesa de Futebol, chegaram ao meio campista do West Ham e à seleção brasileira. Esse fato nos mostra a semelhança com as investigações que ocorrem no mundo corporativo, que é surpreendente.

O caso começou com a detecção de apostas envolvendo cartões amarelos recebidos por Lucas Paquetá durante jogos pelo campeonato inglês. Apostas no valor de aproximadamente R$ 60 mil, que previam que Lucas e Luiz Henrique – atleta do Real Betis da Espanha – fossem advertidos com cartões amarelos, foram registradas em Duque de Caxias, e a movimentação incomum na casa de apostas Betway, patrocinadora do clube, chamou a atenção dos órgãos de integridade.

A Federação Inglesa realizou uma varredura criteriosa, identificando quatro partidas com apostas suspeitas em cartões amarelos de Paquetá. A investigação utilizou pesquisa de fonte aberta – sem a necessidade de quebra de sigilo – para identificar a proximidade entre Paquetá e os apostadores. Esta proximidade levantou suspeitas sobre o possível envolvimento do jogador em situações geradas dentro de campo que resultariam em ganhos financeiros fora dele.

Durante a investigação, Lucas Paquetá forneceu acesso aos seus celulares, mas não foram encontradas conversas explícitas sobre apostas específicas. No entanto, os investigadores alegaram ter provas de proximidade entre Paquetá e os apostadores, o que alimenta suspeitas sobre o envolvimento do jogador em um esquema de apostas esportivas.

Segundo indica Mota, “a Ibia (International Betting Integrity Association) é uma associação criada por casas de apostas do mundo todo que monitora as ações nas bancas e fiscaliza apostas cruzadas dos mais diferentes mercados, seja em resultado de jogos, cartões, combinações e afins”. E continua: “neste trabalho, a Ibia utiliza softwares que têm acesso ao IP dos usuários, o que possibilita identificar a localização da aposta por computador ou celular. A partir do momento que existe uma movimentação suspeita, todas as informações disponíveis através do cadastro do apostador na casa são conhecidas – como documentos, comprovantes de residência e outros.”

Assim como no caso Paquetá, em que órgãos de controle  identificaram e investigaram apostas incomuns, no compliance empresarial situações suspeitas são detectadas por meio de uma combinação de due diligence, monitoramento, auditorias internas, treinamentos contínuos e relatos recebidos via canais de denúncia.

Assim como feito pela Ibia, em empresas, para garantir a eficácia dos programas de compliance, são realizados treinamentos contínuos, capacitando a equipe para identificar e lidar com tais situações. Além disso, ajustes nas práticas são feitos conforme necessário, seguidos por novos treinamentos, assegurando a constante atualização dos procedimentos. Programas de compliance também incluem auditorias periódicas, facilitando a rápida detecção e resposta a atividades suspeitas.

No caso reportado, uma situação identificada entre a conduta do jogador e os apostadores merece destaque, qual seja, o conflito de interesses. Conflito de interesses é um tema central nas discussões de compliance, destacando a importância do alinhamento ético entre indivíduos e as organizações que representam.

No caso de Paquetá, sua conduta ao supostamente receber um cartão amarelo para favorecer terceiros em apostas exemplifica claramente um conflito com os interesses de seu time (empresa empregadora). Tal ação poderia não apenas comprometer a performance do time com a eventual ausência do jogador, mas também colocar em risco um ativo valioso — o jogador que custou ao clube londrino 61 milhões de euros (R$ 360 milhões), caso seja banido do futebol.

Adicionalmente, afeta negativamente a imagem do clube, minando a confiança dos torcedores e patrocinadores.

Em um ambiente corporativo, equipes treinadas para a realização de investigações são de suma importância para entender o modus operandi de indivíduos que atuam de forma não conforme, sendo fundamentais em casos complexos.

A habilidade dessas equipes em identificar padrões e desvios é crucial para desvendar práticas ilícitas, como aquelas que envolvem apostas e conflitos de interesses. Conduzir investigações com equipes internas exige cuidado e demanda um controle rigoroso, garantindo que os processos sejam conduzidos com ética e dentro dos padrões legais.

A expertise e o treinamento de profissionais fazem a diferença, permitindo uma análise detalhada e eficaz, essencial para mitigar riscos e fortalecer as práticas de compliance. No caso de Paquetá, outro ponto de similaridade com o ambiente de empresas se destacou: o jogador forneceu acesso aos seus celulares para que fossem investigados.

No contexto de compliance, o monitoramento de e-mails corporativos, aparelhos celulares fornecidos pela empregadora e plataformas de comunicação interna é uma prática regular e necessária.

Os funcionários, via de regra, são informados previamente sobre essas políticas, não devendo ter a expectativa de que as conversas havidas nesses dispositivos serão confidenciais.

Pelo contrário: desde o início, devem saber que poderão ser monitoradas. Esse monitoramento é crucial para detectar infrações e identificar os responsáveis de forma ágil e eficaz, permitindo à empresa manter a conformidade e a integridade de suas operações.

Auditorias internas são conduzidas regularmente para revisar as transações e as práticas empresariais e, sobretudo, para conferir se as regras internas estão sendo seguidas. Auditores examinam registros financeiros, comunicações internas e atividades de negociação para identificar possíveis irregularidades. No caso em questão, há uma proibição expressa da Federação Inglesa de que atletas da liga apostem ou favoreçam apostas.

As investigações sobre a conduta do jogador e apostadores ainda seguem e novidades devem ser divulgadas em breve, cabendo sempre ao investigado se defender e ter o devido processo legal respeitado.

De toda forma, se você já se perguntou se o mundo da “bola” e da “firma” podem se encontrar em algum momento, eis aqui um exemplo.

Tags: No tags