A cobrança de dívida prescrita é um tema frequentemente debatido e questionado, visto que existem vedações legais ao exercício de tal atividade. Contudo, embora o instituto da prescrição estabeleça prazos para que o credor se utilize de ações judiciais para cobrar o devedor, questiona-se se o mesmo entendimento se aplica à cobrança pela via extrajudicial.
O instituto da prescrição pode ser entendido como a extinção de um direito pela inércia do titular durante certo lapso de tempo, ou seja, quando o credor tem seu direito ao recebimento de valores violado, surge para ele a pretensão de exigir o cumprimento da obrigação, que se extinguirá pelo decurso do prazo previsto na legislação civilista.
Embora a seção de direito privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tenha editado o enunciado de número 11, destacando que “a cobrança extrajudicial de dívida prescrita é ilícita…”, alguns desembargadores têm ido à via oposta do entendimento nele descrito.
Recentemente, o desembargador Marino Neto, da 11ª câmara de direito privado do TJSP, afirmou que, “embora o enunciado, sem a existência de uma lei que preveja como ilícita a cobrança extrajudicial de dívida prescrita, de forma pura e simples, isso é, sem abusos, não há que se falar em ato ilícito.”[1]
No mesmo sentido, em outro caso recente[2], o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a ocorrência de prescrição de dívida vencida há mais de cinco anos, no entanto, a decisão destacou que a prescrição afasta apenas a pretensão do credor de exigir o débito judicialmente, todavia, não extingue a obrigação, ou seja, embora o prazo para ingresso de ação judicial tenha expirado, a dívida ainda existe e o credor mantém o direito de tentar recuperá-la por meios extrajudiciais.
Com isso, podemos considerar alguns pontos importantes:
- A prescrição não extingue a dívida: ela apenas afasta a possibilidade de cobrança pela esfera judicial, no entanto, não extingue a existência da dívida.
- Possibilidade de cobrança de forma amigável: embora a dívida seja excluída dos órgãos de proteção ao crédito após a ocorrência da prescrição, o credor ainda tem o direito de se utilizar de meios amigáveis para negociar o pagamento do débito, sendo esta uma alternativa interessante para fortalecer seu fluxo de caixa e reduzir seu índice de inadimplência.
- Limitações éticas: embora a cobrança extrajudicial seja permitida, é importante destacar que existem limitações éticas ao exercício de tal prerrogativa, de modo que a recuperação do crédito dependerá da voluntariedade do devedor. O Código de Defesa do Consumidor traz vedações legais para condutas que causem constrangimento ou exposição do devedor ao ridículo durante a cobrança, independentemente de a dívida estar ou não prescrita.
Nesse sentido, é possível concluir que as dívidas prescritas podem ser cobradas extrajudicialmente, contudo, é importante lembrar que os preceitos éticos devem ser considerados durante a cobrança, que deve manter o caráter amigável da relação estabelecida.
[1] (TJ-SP – AC: 10226570720228260564 São Bernardo do Campo, Relator: Marino Neto, Data de Julgamento: 12/07/2023, 1ª Turma Recursal Cível e Criminal, Data de Publicação: 13/07/2023)
[2] (TJ-SP – AC: SP 1013718-02.2021.8.26.0361, Relator: Afonso Bráz, Data de Julgamento: 11/08/2022, 17ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/08/2022)