Atualmente, um dos temas mais discutidos na Justiça do Trabalho é o reconhecimento da relação de emprego, considerando que muitos profissionais são contratados sem registro em CTPS. Contudo, em muitos casos, há justificativa plausível para tanto, cabendo à empresa que nega o vínculo esclarecer que a relação não era bem da forma narrada pelo trabalhador.
Se pensarmos em um contrato típico de trabalho, com relação de emprego regida pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), é primordial que se configure a subordinação entre o trabalhador e seu empregador. Desse modo, o empregado sequer tem autonomia para determinar seus próprios horários de trabalho, tampouco pode optar, livremente, por se ausentar do trabalho sem justificativa e sem sofrer punições pela falta injustificada.
Ocorre que, em diversas relações de trabalho, realmente não estamos diante da clássica figura de um empregado que se submete ao controle de horários e às escalas predeterminadas, e/ou que se sujeite a sanções disciplinares, como advertências e suspensões.
Um bom exemplo é extraído do recente julgamento da 02ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 09ª Região, que negou o pedido de vínculo empregatício de um motoboy, entregador atrelado a aplicativo (0000714-98.2022.5.09.0652).
No caso em discussão, o entregador era cadastrado em plataforma e recebia por entrega feita, tendo requerido vínculo com dois postos de combustível. Mesmo que as empresas estabeleçam os critérios para a prestação de serviços e a dinâmica da atividade econômica, incluindo o valor das corridas, o padrão de atendimento e o tempo estimado das viagens, não restou configurado um vínculo de emprego.
Isso porque, o relator, ao se atentar à prova documental apresentada pela empresa, identificou que o profissional, então Reclamante, passou por alguns períodos sem realizar qualquer entrega, o que já afasta a habitualidade esperada de uma relação de emprego. Do mesmo modo, confirmado que o motoboy tinha liberdade para cancelar corridas quando bem quisesse, o que, novamente, jamais aconteceria em uma típica relação de emprego.
Se não bastasse, o próprio motorista afirmou em audiência que não seria punido por se ausentar do trabalho, já que era ele quem organizava sua própria escala de dias e horários e, portanto, definia quando pretendia fazer as entregas. Ao se ausentar por uns dias, por qualquer período que fosse, sequer estava sujeito a sanções das empresas e tampouco teria que justificar sua ausência na plataforma.
Para além de inexistir subordinação, principal elemento do vínculo empregatício, tampouco foi habitualidade, justamente em razão das ausências e da possibilidade de trabalho para outras empresas, e muito menos identificada pessoalidade, já que na ausência daquele motoboy, outros que estivessem ativos poderiam ser acionados para as viagens.
Cenários semelhantes são uma realidade comum na Justiça do Trabalho, em que o reconhecimento ou negação do vínculo empregatício depende das evidências apresentadas tanto pelo trabalhador quanto pela empresa.
Para o empregador, há maneiras de mitigar os riscos de um vínculo empregatício ao ajustar a rotina de trabalho desde o início da contratação. Isso envolve evitar a presença concomitante de elementos como subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade, garantindo especialmente a autonomia do prestador de serviços. Isso significa liberá-lo de controles rigorosos de dias e horários, assim como de medidas punitivas por eventuais ausências.