Na sociedade atual, altamente globalizada, diversos desafios foram trazidos pelo excesso de conectividade e pela fácil disseminação de informações. Os pontos positivos da inserção da tecnologia no dia a dia são infinitos, contudo, um grande ponto que gera muita discussão é a segurança dos dados compartilhados.
Cada vez mais, os dados são processados e valorados economicamente, sendo considerados, inclusive, um dos principais insumos da sociedade contemporânea. Diante disso, a necessidade de regulamentação digital se tornou imperativa, uma vez que existem aproximadamente 50 bilhões de aparelhos conectados no mundo, e 71% da população brasileira está acessando a internet. Nessa toada, com o surgimento de diversos litígios, criou-se a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), nº 13.709/2018, que protege dados pessoais sensíveis e, assim, os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade dos indivíduos.
Apesar de a LGPD não mencionar diretamente a figura do trabalhador, mas sim do consumidor, a relação de trabalho, assim como a consumerista, trata de grande volume de dados pessoais, sendo necessário que haja a implementação de devidos cuidados no tratamento e no armazenamento das informações.
Afinal, o empregador passa a armazenar dados desde a fase pré-contratual, passando pela vasta documentação de toda a vigência do contrato de trabalho e, também, mesmo após o encerramento do pacto laboral, e, em todos esses momentos, passa a ser responsável pelo armazenamento e pela guarda dos dados pessoais dos trabalhadores.
No rompimento da relação contratual de trabalho, caso o empregador acredite ser plausível, juntamente com o aval do empregado, que até então lhe prestava serviços, nada impede a eliminação dos dados coletados, observado o disposto no art. 15 da LGPD e seus incisos, que apontam as hipóteses do término do tratamento de dados pessoais.
Por outro lado, essa não parece ser a medida mais cautelosa no momento da rescisão do contrato de trabalho, tendo em vista que o empregador pode ser futuramente acionado na Justiça e passe pela necessidade de fazer uso dos dados armazenados.
Ora, a figura do empregador deve se atentar ao fato que, mesmo após o encerramento do contrato de trabalho, a empresa tem a possibilidade de permanecer com os dados dos colaboradores, visto que, segundo o art. 16, I, da Lei nº 13.709/2018 (“cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador”), caso o funcionário ingresse com uma reclamação trabalhista, há o direito constitucional de ampla defesa e contraditório.
Dessa forma, a LGPD legitima a permanência dos dados armazenados pelo empregador/controlador no prazo prescricional das pretensões que possam vir a ser reivindicadas, eis que, em eventual judicialização, a empresa se verá na necessidade de produzir prova documental para afastar as alegações do trabalhador.
Assim, poderá a empresa se utilizar de documentos como o contrato de trabalho, cartões de ponto, holerites, prontuários médicos, entrevistas de avaliação de desempenho e de desligamento, pesquisas internas, entre outros, que permanecerão armazenados de forma prolongada.
A medida serve justamente para que seja possível a defesa de pretensões sujeitas à típica prescrição dos últimos cinco anos, a contar do ajuizamento do processo ou, até mesmo, e em maior cautela, a demandas que possam ter o prazo prescricional suspenso ou impedido. É o caso de algumas discussões de vínculo de emprego e de doença ocupacional.
Ademais, existem decisões proferidas pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) baseadas na LGPD apontando a importância da transparência entre empregado e empregador, no que tange o uso dos seus dados pessoais, inclusive na fase pós-contratual, de maneira que, caso haja eventual falha na proteção, seja cabível a responsabilização civil, resultando em sanções face o empregador.
Com isso, dentre as diversas penalidades no âmbito cível e penal, podem ser geradas desde advertências a multas de até R$ 50.000.000,00 por infração cometida, como alguns exemplos previstos no art. 52:
- Advertência, para que haja adoção de medidas corretivas, com indicação de prazo;
- Multa simples, de até 2% do faturamento líquido da pessoa jurídica, limitada, no total, a R$ 50.000.000,00 por infração;
- Multa diária, limitando-se ao valor de R$ 50.000.000,00;
- Publicização após devidamente apurada e confirmada a ocorrência da infração;
- Bloqueio dos dados pessoais envolvidos na infração até a sua regularização;
- Eliminação dos dados pessoais relacionados à infração.
Dessa forma, a empresa pode optar pela manutenção dos dados de seus ex-funcionários, e é até mesmo recomendável que o faça, a fim de mitigar riscos de um passivo trabalhista. Contudo, caso esta seja essa a situação, o tratamento de dados deve seguir o disposto na LGPD, com o mesmo zelo da época em que o contrato de trabalho estava vigente, sob pena de infração e pagamentos de sanções em caso de inadimplemento.
Referências
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm