O Governo Federal publicou no dia 30 de abril a Medida Provisória (MP) nº 1.171/2023. A principal alteração trazida pela norma se refere a polêmica tributação automática de lucros apurados em empresas controladas no exterior detidas por pessoas físicas. Além disso, a MP trouxe algumas outras mudanças importantes: (i) alteração das alíquotas aplicáveis aos demais rendimentos e aplicações financeiras no exterior; (ii) uma inédita regulamentação tributária sobre “trusts” no exterior; (iii) um programa opcional de atualização do valor de mercado de ativos no exterior; e (iv) atualização da tabela progressiva do IRPF. Diante dessas novidades, os contribuintes deverão reconsiderar seus planejamentos tributários.
Os rendimentos do capital aplicado no exterior detidos diretamente por pessoas físicas no exterior (aplicações financeiras, lucros e dividendos de entidades controladas e bens e direitos objeto de “trust”) serão tributados, a partir de 2024, de forma separada dos demais rendimentos na Declaração de Ajuste Anual (DAA), através de alíquotas diferenciadas sobre a parcela anual de rendimentos: 0% de até R$ 6 mil, 15% sobre o que exceder R$ 6 mil até R$ 50 mil e 22,5% sobre o que exceder R$ 50 mil. Tal tributação ocorrerá no momento da disponibilidade dos valores às pessoas físicas (p. ex. vencimento do título, liquidação da operação, resgate e amortização).
Outra alteração, e a mais importante, se refere aos lucros auferidos por “holdings offshore”
detidas por pessoas físicas – atualmente tributados no Brasil somente quando distribuídos aos seus sócios. Pela redação da MP, haverá tributação automática – independente de distribuição de valores aos sócios – sobre esses rendimentos, com base nos balanços levantados anualmente em 31 de dezembro, pelas alíquotas progressivas mencionadas acima (0% a 22,5%). Essa tributação ocorrerá somente quando tais empresas estiverem localizadas em países considerados paraísos fiscais ou terem renda ativa (atividades operacionais, excetuadas receitas de aplicação financeira, royalties, juros, dentre outras) inferior a 80%.
A MP também traz como novidade alguns incentivos fiscais e ferramentas para planejamento tributário com a possibilidade de os contribuintes atualizarem espontaneamente o valor dos seus ativos detidos no exterior, pagando IRPF de 10%. O que poderá ser uma oportunidade para obter economia futura em ganhos de capital de ativos (inclusive imóveis, aeronaves e embarcações) no exterior, pagando 10% agora e ganhando custo de aquisição que pode ser abatido no futuro contra uma alíquota maior (15% a 22,5%), bem como possibilitando que lucros acumulados já existentes nas empresas sejam tributados a 10% e não sejam mais sujeitos à tributação quando da sua distribuição. Esta opção poderá ocorrer até Novembro de 2023.
Por último, vale destacar que a Medida Provisória em questão também: (i) institui tratamento tributário específico para “trusts”, desconsiderando a existência da figura do “trust”, exigindo a declaração pelo contribuinte dos bens e tributando conforme novas regras; e (ii) atualiza a tabela do IRPF, que passaria a ter a faixa de isenção subindo de R$ 1.903,98 para R$ 2.112,00.
Diante das alterações citadas acima, observa-se que a norma trouxe importantes mudanças na forma de tributação de ativos no exterior para as pessoas físicas. O ponto mais controverso é a tributação automática de lucros apurados nos balanços de empresas “offshore”, algo que já vinha sendo colocado em pauta desde o Projeto de Lei de Reforma do IRPF de 2022 (PL 2.337/21). Tal tributação por distribuição “fictícia” de lucros pode ser vista como ilegal, já que desrespeita o princípio da disponibilidade da renda do art. 43 do CTN, tendendo a gerar discussões contenciosas no assunto.
Embora a MP ainda deverá ser apreciada pelo Congresso Nacional e, mesmo que aprovada apenas terá efeitos a partir de 2024, os contribuintes interessados deverão se atentar em seus planejamentos tributários, já que eventual aprovação da norma poderá demandar alterações e redesenho de estruturas existentes que demandam tempo.