O papel do acordo de sócios em operações de investimento e aquisições parciais

Em operações de M&A são comuns as aquisições parciais, ou seja, as operações em que o investidor adquire participação societária em determinada sociedade sem que passe a deter o poder de controle – que aqui pode ser entendido como o poder de um sócio ou grupo de sócios para dirigir e orientar as atividades da empresa e o funcionamento de seus órgãos administrativos e executivos.

Neste cenário de investimento ou aquisição parcial, tanto o investidor (ou novo sócio), quanto aqueles que fundaram ou que já compunham o quadro de sócios da sociedade, possuem direitos e responsabilidades sobre a gestão dos negócios. Regular essa gestão e estabelecer limites e alçadas para a atuação dos sócios, especialmente em assuntos críticos, costuma ser desafiador, já que, ainda que o investidor não detenha o controle, desejará que seu voto tenha relevância para a tomada de determinadas decisões. Afinal, as razões pelas quais se originou a parceria, sejam elas puramente financeiras, tecnológicas, mercadológicas, que envolvam marca e/ou know-how ou ainda uma mistura de todas essas (como ocorre na maioria das vezes), costumam ser afetas à gestão e desenvolvimento do negócio e, por isso, merecem especial atenção.

E é justamente nos momentos de gestão compartilhada, em maior ou menor grau, que o acordo de sócios pode ser uma ferramenta valiosa não só para regular os direitos e deveres dos sócios, mas para estabelecer mecanismos de governança corporativa adequados ao desenvolvimento dos negócios e sucesso da parceria recém-formada.

O acordo de sócios é previsto no artigo 118 da Lei 6.404/1976. Este nada mais é do que um documento que estabelece as regras e diretrizes para a relação entre os sócios de uma sociedade. Ele define os direitos e responsabilidades de cada sócio, regulando aspectos como a gestão do negócio, a tomada de decisões, a distribuição de lucros, cessão e transferência de participação societária e a resolução de conflitos. Diferentemente do contrato ou estatuto social, esse documento tem caráter privado e deve ser arquivado apenas na sede da sociedade.

Para além do contrato que formaliza a operação, a celebração de um acordo de sócios possibilita estabelecer regras de governança corporativa que garantam a participação dos novos e antigos sócios, investidores e fundadores, na condução dos negócios em linha com a estratégia de desenvolvimento da sociedade, de modo a compatibilizar os interesses da sociedade e dos sócios, as expectativas e planos existentes antes do investimento e a nova visão trazida pelo investidor.

Dentre estas regras e mecanismos, destacamos a possibilidade de (i) vincular a aprovação de alguns temas a um quórum superior ao legal, conferindo ao investidor controle sobre temas de maior relevância; (ii) prever a prestação periódica de contas pelos administradores, mantendo não só o investidor, mas todos os demais sócios, cientes de temas estratégicos e do andamento das atividades empresariais; e (iii) em estruturas mais complexas, definir que determinados membros da administração sejam indicados pelo investidor e condicionar sua atuação a determinados parâmetros e métricas, inclusive à possibilidade de representar a sociedade e assinar documentos junto de outro administrador, conferindo assim maior controle sobre o dia-a-dia empresarial.

A instituição de conselhos e/ou comitês (administrativo, fiscal ou consultivo) também é uma estratégia interessante para resguardar os interesses dos novos e dos antigos sócios da sociedade. A instituição destes órgãos é comumente acompanhada de um plano de negócios previamente pactuado entre os sócios, de forma que a atuação dos conselheiros, administradores e até mesmo dos próprios sócios fundadores ou do investidor, caso ocupem tais cargos na administração da Sociedade, fiquem vinculados aos termos ali estabelecidos.

Ferramentas como essas permitem que investidores e novos sócios participem mais ativamente da gestão da sociedade, ao passo que também garantem segurança aos sócios anteriores de que o investimento não representará perda de controle sobre o negócio construído e gerido até então, além de corroborar a efetividade dos termos e condições pactuadas entre as partes no momento da operação.

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