Com a ascensão da economia verde a nível mundial, temas antes pouco debatidos ganham cada vez mais espaço nas análises econômicas e mercadológicas. Esse, certamente, é o caso do mercado de créditos de carbono, orientado pelos sensíveis impactos das mudanças climáticas em nosso dia a dia e criado como mais um instrumento no embate pela redução das emissões dos gases geradores do efeito estufa.
Por crédito de carbono, entende-se o título correspondente a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2), ou gás equivalente, reduzido ou removido da atmosfera, negociável em mercados regulados ou mercados voluntários.
Nesse contexto, os mercados voluntários têm alcançado destaque. Atentas às demandas de Compliance e ESG, empresas nacionais, mesmo sem imposição legal de metas nesse sentido, têm adquirido créditos de carbono visando à compensação de suas próprias emissões e à demonstração do seu compromisso com a sustentabilidade.
No entanto, as transações no mercado voluntário exigem cautela para garantir que os créditos de carbono adquiridos não apenas desempenhem seu papel ambiental e social, mas também não representem riscos econômicos e reputacionais para as empresas.
Por essa razão, a integridade dos créditos de carbono tem sido uma preocupação constante entre compradores e desenvolvedores. Embora ainda não haja parâmetros definitivos para determinar o que constitui um crédito de carbono de alta qualidade, diversas iniciativas têm trabalhado nesse sentido, estabelecendo princípios mínimos para orientar o mercado de carbono e garantir a segurança das partes envolvidas.
Esse é o caso, por exemplo, do The Core Carbon Principles (CCP), listagem elaborada no primeiro trimestre de 2023 pelo Integrity Council for the Voluntary Carbon Market (ICVCM), com 10 princípios essenciais a qualquer crédito de carbono que se pretenda de alta qualidade. Os princípios indicados foram: (i) governança eficaz, (ii) seguimento (ou rastreabilidade) dos créditos, (iii) transparência, (iv) validação e verificação robustas por terceiros independentes, (v) adicionalidade, (vi) permanência, (vii) quantificação robusta das remoções e reduções de emissões, (viii) prevenção à dupla contagem, (ix) benefícios e salvaguardas do desenvolvimento sustentável e (x) contribuição à transição líquida zero.
Os princípios mencionados não são os únicos nesta área. Em janeiro de 2023, foi divulgado o “Guia de Integridade de Crédito para Florestas Tropicais” (TFCI, sigla em inglês), elaborado por oito organizações da sociedade civil: IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), Conservation International, EDF (Environmental Defense Fund), Flora & Fauna International, National Wildlife Federation, Nature4Climate, We Mean Business Coalition e Sociedade de Conservação da Vida Selvagem.
O TFCI estabelece cinco critérios principais para determinar a integridade dos créditos de carbono: (a) reconhecimento dos povos indígenas e comunidades locais como parceiros ativos, não apenas beneficiários passivos, (b) distribuição equitativa e transparente de benefícios, (c) estabelecimento de linhas de base conservadoras e confiáveis, (d) garantia de permanência e (e) consideração de critérios adicionais de integridade ambiental, como evitar a duplicação de contagens, promover a biodiversidade e alinhar-se aos programas jurisdicionais, entre outros.
Como visto, não há uniformidade na definição de parâmetros para a compreensão da integridade de créditos de carbono. No entanto, a partir apenas das duas sistematizações apresentadas, resguardadas as suas peculiaridades típicas, já há de se notar conceitos indispensáveis a créditos de carbono de alta qualidade, muitos deles conceitos profundos que demandariam outros boletins como este, como dupla contagem, permanência, repartição de benefícios e linhas de base.
Por ora, um fato é certo: ao se pretender desenvolver ou adquirir créditos de carbono, é fundamental a contratação de uma auditoria especializada. Não se pode cogitar a feitura de qualquer transação com crédito de carbono antes de um rigoroso processo de due diligence, acompanhado por profissional que avalie aspectos jurídicos e econômicos, como questões ambientais, sociais, imobiliárias, fiscais e outras.