Votado em menos de 20 minutos pela Câmara dos Deputados em 26/03/2024, o Projeto de Lei nº 03 de 2024, que visa alterar a Lei de Recuperação Judicial e Falência, não vem agradando especialistas atuantes na área, especialmente os profissionais que lidam com administração judicial. Após ter seu texto original emendado em 49 trechos, o projeto aguarda agora a apreciação do presidente da república.
Na legislação atual, o administrador judicial é um auxiliar preferencialmente nomeado pelo juiz responsável, apto a fiscalizar a empresa em recuperação ou a dar andamento ao processo de falência. Entre suas funções na recuperação judicial, o administrador judicial tem a obrigação de fiscalizar o cumprimento das obrigações da empresa devedora, atividade que, conforme a lei, perdura por dois anos. Já na falência, cabe a ele arrecadar e alienar os ativos da massa falida, uma vez que a empresa deixa de operar no mercado.
Em ambos os casos, falência e recuperação judicial, o cargo atualmente perdura até que o processo seja encerrado por sentença judicial, e não há qualquer limitação quanto ao número de processos sob a condução de cada administrador judicial. No entanto, será estabelecido o pagamento de remuneração, calculada com base no valor do passivo (no caso de recuperação judicial) ou confrontada com a complexidade do caso e o valor praticado no mercado para a mesma função (no caso da falência).
Dentre as principais e polêmicas alterações previstas no Projeto de Lei, destaca-se que a forma de nomeação e a função do administrador judicial foram sensivelmente reduzidas. Agora, o projeto abre margem para que a escolha não esteja vinculada necessariamente a um profissional de confiança do juiz da causa, estipulando, ainda, que o tempo de atuação do administrador judicial no cargo perdure por no máximo três anos, vedada a recondução.
Da mesma forma, limitou-se a remuneração do administrador, que passará a ser calculada com base no salário mínimo, estabelecendo um teto máximo para o valor de remuneração e para a quantidade de processos sob a condução de um mesmo profissional.
Outra inovação do PL é a implementação de um prazo para a alienação dos ativos da empresa falida, que poderá passar a ser de 180 dias, assim como para apresentar o denominado “plano de falência”. Esse documento, que deverá ser apresentado em 60 dias da quebra e submetido à coletividade de credores e ao magistrado, trata-se de um plano de ação prático sobre como será conduzida a falência. O projeto também prevê a possibilidade de postergar o prazo de alienação para 180 dias, contados da arrecadação dos bens, por até 3 anos, prorrogável uma única vez por igual período, além de determinar a apresentação de um cronograma de pagamento dos credores.
Cumpre ressaltar que o objetivo principal do processo falimentar é a liquidação dos ativos e a realocação dos bens produtivos no mercado, a fim de evitar sua excessiva deterioração.
Com base nessa premissa, foi criada uma nova figura no processo de falência, denominada gestor fiduciário. Esse profissional será escolhido pelos credores em assembleia e terá os mesmos deveres do administrador judicial, ou seja, impulsionar e dar andamento ao processo de falência, viabilizar a alienação dos ativos da massa visando à melhor utilização dos bens ao retornar ao mercado e, com o valor obtido da alienação, pagar os credores. Neste ponto, surge uma polêmica sobre o interesse desse credor fiduciário, que, na qualidade também de credor, poderá apresentar um plano que o beneficie mais.
Em relação aos débitos tributários, com a vigência do novo texto, estes ainda se encontrariam excluídos do processo de recuperação judicial. Entretanto, foi oportunizada uma maior flexibilidade ao Fisco nas transações fiscais, autorizando-se a aplicação de maior percentual de desconto para quitar os créditos pendentes.
Ainda não é possível confirmar qual será o texto final aprovado e quais disposições serão vetadas pelo presidente da República. No entanto, as alterações realizadas são profundas e impactantes, o que deve gerar ainda muitos embates judiciais até que a jurisprudência e a prática processual estejam consolidadas sob seus efeitos.