Os desdobramentos criminais de fiscalizações e autuações do fisco já são, há muito tempo, uma preocupação do empresariado brasileiro. Isso porque, já se sabe que é praticamente certa a instauração de um inquérito policial para apuração de eventual crime contra a ordem tributária após a decisão final no processo administrativo fiscal, quando não há o pagamento.
Em outras palavras, caso constituído definitivamente o crédito no âmbito administrativo, não realizado o pagamento, o fisco apresenta automaticamente a Representação Fiscal para Fins Penais ao Ministério Público que, por sua vez, de maneira reflexa determina a instauração de inquérito policial.
E, aqui, é importante abrir um parêntese para lembrar que em quase totalidade dos casos, os investigados são os sócios e/ou diretores da empresa em razão da posição que ocupam.
No entanto, de maneira excepcional, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região – TRF-2 (Rio de Janeiro), ao julgar recentemente o habeas corpus impetrado pelo Diretor de uma empresa que estava sendo investigado por suposto crime contra a ordem tributária, determinou o trancamento do inquérito policial instaurado com base exclusiva em representação fiscal para fins penais.
O julgamento apresenta uma reflexão necessária sobre o oferecimento da representação fiscal para fins penais e seus efeitos, hoje automáticos, especialmente a instauração do inquérito policial, o que muito preocupa o empresariado.
Nesse sentido, o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal – 2 destaca que a determinação de instauração de inquérito policial ante ao recebimento da representação fiscal para fins penais pelo Ministério Público deve ser precedida de uma análise mínima de indícios de intenção de fraudar ou suprimir tributos, sendo que na hipótese de sua inexistência, a abertura do inquérito policial é ilegal, como afirmou o Desembargador Athie.
Segundo os desembargadores, no caso concreto, a Representação Fiscal para Fins Penais enviada pela Receita Federal ao Ministério Público, comunicando uma dívida tributária da empresa, não apresentava indícios mínimos de crime.
Por fim, mas não menos importante, vale destacar ainda que, conforme mencionado pelo Desembargador Antonio Ivan Athie, a análise prévia do Ministério Público, para determinar ou não a instauração de inquérito policial, deve considerar a decisão administrativa quanto à multa imposta. No caso julgado, por exemplo, o CARF não impôs à empresa a multa qualificada de 150%, quando se entende por fraude ou sonegação, razão pela qual não haveria nem mesmo que se presumir a fraude.
A decisão proferida é um importante precedente que demonstra que não se pode admitir mais o início de investigações sob o fundamento de que se estaria apurando crime contra a ordem tributária quando se está diante de um claro caso de inadimplência, sob pena do início prematuro de uma investigação caracterizar um meio de coação para que a pessoa física investigada (sócios e diretores) promovam o pagamento do tributo.
Afinal, como mencionou O Ministro Luiz Fux no julgamento da ADI 4980, “é evidente que uma pessoa de bem, diante da iminência de ser processada criminalmente, corre, paga e vai discutir depois…”.