Pouco tempo após as declarações do Ministro da Economia, Paulo Guedes, sobre as alterações da Lei 11.101/2005, o Senado aprovou o projeto de Lei nº 4.458/2020, que faz alterações substanciais à Legislação de recuperação judicial e falência.
Em seu discurso, Guedes tratou tal reforma como favorável à economia do país, pois visa a correção de alguns problemas que a lei atual apresentou ao longo de seus 15 anos de vigência.
Mas como bem sabemos, no Brasil, nem toda boa intenção da lei acaba se revelando eficaz na prática. Um exemplo disso são institutos presentes na atual lei que, no linguajar popular, “não vingaram”, como, por exemplo, a Recuperação Extrajudicial.
Pois bem, o escopo dessa reforma é justamente corrigir as dificuldades que a Lei apresenta, nesse sentido, para ficar no exemplo da Recuperação Extrajudicial, o Projeto aprovado corrige um item que inviabilizou a utilização desse instituto. Com a nova Lei, será possível fazer a Recuperação Extrajudicial quando houver passivo trabalhista (o que não é permitido atualmente), desde que haja a negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional.
Nesse cenário, é importante dizer que muitos dos novos institutos poderão ser inócuos e, na prática, não modificarem muita coisa, enquanto alguns outros prometem trazer ainda maiores entraves aos devedores que buscam solucionar a crise enfrentada através deste instituto. Além disso, a Jurisprudência também dará contribuição na moldagem da nova lei, trazendo novas interpretações, bem como eventuais inconstitucionalidades das modificações.
Fato é que, apesar do imponderável efeito que o tempo trará às modificações legislativas, são diversas as situações que o Projeto de Lei visa modificar e/ou acrescentar na Lei de Recuperação e Falência, como: a regulamentação de dívida tributária; as regras novas para transação tributária; a faculdade dos credores elaborarem um Plano de Recuperação Judicial para o devedor; os novos procedimentos para dívidas transacionais e a ampliação do rol de situações para a decretação de falência.
Nesse artigo, elencamos cinco modificações que entendemos serem importantes e modificativas de nosso cotidiano:
FINANCIAMENTO DE RISCO
O projeto aprovado regula o Dip Financing (debtor in possession financing) que, por trazer muitos riscos, atualmente, acaba sendo feito por poucas instituições financeiras. Com a regulamentação ofertada, procura-se dar maior segurança às instituições financiadoras o que, em tese, acarretaria em mais movimentações, incrementando, assim, a Economia. Apesar da boa intenção, essas modificações dependerão de como o mercado as receberá, de modo que, tanto pode ser uma das modificações inócuas, como realmente fazer jus ao discurso do Ministro da Economia.
PRODUTOR RURAL
Outra mudança significativa é a autorização para que produtores rurais que atuem como pessoa física peçam a Recuperação Judicial, algo que, pela lei atual, não era permitido, bem como a autorização para que o produtor rural com dívidas não superiores a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) possa se valer de apresentação de plano especial o que na Lei n. 11.101/2005 é prerrogativa exclusiva de microempresas e empresas de pequeno porte.
Contudo, apesar dessa conquista, a regulamentação do Produtor Rural traz alguns vieses que entendemos negativos, como a retirada do rol de créditos sujeitos à Recuperação Judicial dos créditos provenientes de CPRs (Cédulas de Produto Rural), o que, como sabemos, assim como as alienações fiduciárias, formam um grande conjunto de dívidas do produtor rural e que, ao revés de beneficiar, poderá inviabilizar alguns pedidos de recuperação judicial de produtores rurais.
Ainda, o projeto prevê que somente serão incluídos na recuperação judicial do produtor rural aqueles créditos que constarem na contabilidade do devedor e que também serão excluídos da Recuperação Judicial os créditos relativos à dívida constituída nos últimos três anos anteriores ao pedido de recuperação com finalidade de aquisição de propriedade rural.
SUSPENSÃO DAS AÇÕES
A atual lei prevê a suspensão de ações executórias contra a empresa em recuperação judicial pelo prazo improrrogável de 180 dias. A jurisprudência, temperando tal entendimento, aceita a prorrogação desse prazo, conhecido como stay period, desde que alguns requisitos sejam obedecidos.
Com a alteração proposta, o prazo poderá ser prorrogado, apenas, por duas vezes. A primeira à critério do juiz e a segunda, dos credores.
CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO
O Projeto procura trazer ao mundo da Recuperação Judicial os institutos da conciliação e mediação, reforçando o seu uso com a criação do mecanismo de suspensão das execuções pelo prazo de 60 dias. Essa suspensão, como incentivo, visa desjudicializar recuperações que são viáveis economicamente. Contudo, trata-se de mais um instituto que apenas o tempo nos dirá sobre a sua eficácia.
PROTEÇÃO DO ADQUIRENTE DE BENS
Visando dar maior celeridade à venda de ativos, o projeto amplia a blindagem que o adquirente já possui, deixando expressamente estabelecido que não assumirá nenhuma dívida, seja ela de natureza ambiental, regulatória, administrativa, tributária, penal, trabalhista ou derivada de normas anticorrupção.
Por fim, cabe uma ressalva sobre todas as modificações apontadas acima, o texto, já aprovado nas duas Casas Legislativas (PL 10.220/2018 no Congresso e PL 4.458/2020 no Senado) encontra-se para a Sanção presidencial. Isto é, o Presidente da República tem 15 dias úteis para a sanção do texto aprovado. Lembrando que, existe a faculdade do Presidente vetar o texto em sua completude ou em apenas alguns artigos.
Caso ocorra o veto, ele poderá ser tanto político (quando o Presidente da República considera o dispositivo contrário ao interesse público), bem como jurídico (quando, inconstitucional).
O projeto deverá entrar em vigor 30 dias após a sua promulgação (ato da sanção presidência), ou seja, não tardará muito, teremos modificações substanciais na Legislação Falimentar e de Recuperação Judicial.