O instituto da desconsideração da personalidade jurídica, que visa garantir a satisfação de um crédito e evitar a perpetuação de situações de abuso, busca assegurar a efetividade da justiça, bem como proteger os direitos dos credores diante de situações em que a personalidade jurídica é utilizada de maneira indevida ou fraudulenta.
Essa medida permite estender os efeitos das obrigações da empresa aos seus sócios, direcionando a execução de uma dívida da pessoa jurídica devedora para a pessoa física do sócio ou acionista, com o objetivo de garantir a satisfação de crédito pela pessoa interessada.
Para aplicação do instituto, existem duas teorias distintas. A teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, adotada como regra geral pelo ordenamento jurídico, encontra previsão no artigo 50 do Código Civil e dispõe que a medida somente pode ser autorizada mediante a clara comprovação de abuso da personalidade jurídica, seja por desvio de finalidade da pessoa jurídica, seja por confusão patrimonial entre seus bens e os dos sócios.
Já a teoria menor, aplicada especialmente nas relações de consumo, tem o intuito de proteger os consumidores, vulneráveis nessas relações jurídicas, de práticas abusivas por parte das empresas. Essa teoria permite a aplicação da medida a partir da simples demonstração do estado de insolvência da empresa.
Aqui, a desconsideração da personalidade jurídica é aplicada quando a pessoa jurídica utiliza sua estrutura para frustrar a execução de decisões judiciais em face de relações de consumo, assegurando, assim, a efetividade dessas decisões e protegendo os consumidores lesados, em situações específicas relacionadas ao abuso do poder econômico.
Logo, nesses casos, para que ocorra a desconsideração, com a consequente inclusão dos sócios, basta a comprovação de insolvência da pessoa jurídica, sendo desnecessária, portanto, a demonstração de fraude ou abuso de direito, como ocorre em regra.
Aliás, o Superior Tribunal de Justiça tem adotado o entendimento no sentido de que a desconsideração poderá ocorrer quando a empresa apresentar obstáculos ao efetivo pagamento dos prejuízos ocasionados, o que facilita que os direitos dos consumidores, eventualmente lesados por práticas fraudulentas, sejam garantidos. Inclusive, esse entendimento foi adotado no julgamento do AREsp 823.555.
De todo modo, a Corte Superior tem estabelecido limites relacionados à responsabilização dos sócios nessas hipóteses.
Isso porque, mesmo partindo de uma interpretação dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, não é possível responsabilizar pessoalmente que, ainda que sócio, não exerça atos de gestão. Da mesma forma, também não é cabível a responsabilização daquele que pratica atos de gestão, entretanto, não compreende o quadro societário.
Dessa forma, em síntese, o que se verifica é que o Superior Tribunal de Justiça admite a aplicação da teoria menor para fins de desconsideração da personalidade jurídica apenas em hipóteses excepcionais, cabendo aos credores a demonstração, caso a caso, do preenchimento dos requisitos necessários.