Não há dúvidas de que o e-mail corporativo pode ser acessado pelo empregador por se tratar de ferramenta de trabalho, mas e o pessoal? Seria tal correspondência eletrônica intocável?
Há quem defenda que a correspondência eletrônica de uso pessoal do empregado, ainda que utilizada em computador da empresa é inacessível pelo empregador, justamente por, em regra, envolver apenas assuntos particulares – tudo em atenção ao direito constitucional de sigilo das correspondências (artigo 5º, XII, da Constituição Federal).
Contudo, a depender do caso concreto, há a possibilidade de contrapor valores fundamentais e, com a finalidade de proteger direitos da parte contrária, esses podem ocasionalmente ser priorizados em detrimento dos direitos daquele que enviou ou recebeu as correspondências. Entretanto, neste ponto, nada é absoluto.
Um dos assuntos mais comentados da semana foi justamente a recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que, ao julgar processo que tramita há anos, e em segredo de justiça, limitou a quebra de sigilo do e-mail particular do ex-empregado de uma empresa paulista.
Inicialmente, em demanda cível, a empresa obteve autorização da Justiça Comum para acessar integralmente os e-mails trocados pelo empregado, por suspeitar que esse repassaria informações confidenciais a terceiros. No caso, a um escritório de advocacia, possivelmente se preparando para ajuizar uma reclamação trabalhista em momento oportuno.
A medida foi igualmente aceita pela Justiça do Trabalho, oportunidade na qual o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região também autorizou a quebra de sigilo dos e-mails. Afinal, poderia o empregado violar segredo industrial da companhia e se favorecer de seu cargo e da facilidade de acesso a documentos da empresa para benefício próprio ou, até mesmo, de terceiros.
Em alguns casos sensíveis, especialmente envolvendo interesse público na apuração de infrações penais, a inviolabilidade das comunicações deixa de ser absoluta. Para casos menos gravosos, envolvendo temáticas da relação de emprego, sem suspeitas de crimes, o acesso às correspondências pessoais se torna ainda mais difícil.
Ainda que se entenda pertinente o acesso às mensagens pessoais, não há como ignorar o fato de que o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) não prevê que o conteúdo da comunicação privada seja requisitado, ainda que judicialmente, para fins probatórios. O artigo 22 da lei tão apenas valida que os registros de conexão ou de acesso a aplicações de internet sejam fornecidos.
Sendo assim, aplicando tal entendimento à Justiça do Trabalho, e pelo que determinou o TST, o acesso ao e-mail pessoal do empregado até pode acontecer em situações pontuais, desde que limitado exclusivamente aos metadados das mensagens trocadas pelo empregado, e não ao conteúdo que tenha sido enviado e recebido.
Quando pensamos em metadados, estamos diante de registros de datas e horários das conversas, bem como endereços de IP das máquinas e contas eletrônicas envolvidas nas trocas de mensagem. Essas informações já podem ser suficientes, ou ao menos capazes de fortalecer indícios que, atrelados a outras provas, evidenciem a ocorrência ou não do fato a ser apurado.
Válido destacar que o uso de provas digitais vem ganhando cada vez mais força na Justiça do Trabalho e que os metadados têm sido utilizados como grandes aliados para firmar o convencimento dos juízes a respeito de temáticas diversas envolvendo relações de emprego. Apenas a título de exemplo, é crescente o uso de mensagens criptografadas do WhatsApp, movimentações nas redes sociais e, em especial, compartilhamento de dados de geolocalização.
De todo modo, por maior que seja a facilidade e a rastreabilidade de provas digitais, quando a discussão envolver a inviolabilidade e-mails pessoais do empregado, exigir o acesso ao conteúdo das mensagens trocadas ainda não é uma opção fácil para as empresas.