Sim, existe. Quando se fala na montagem de uma estrutura dedicada às rotinas de conformidade em uma empresa, um formato se destaca: um profissional dedicado, uma equipe de apoio, multiplicadores de conhecimento, e independência operacional.
É claro que um ou outro ajuste poderá ser feito em função do tamanho da empresa e do tipo de negócio operado, ora com o responsável por conformidade cumulando outras funções, ora sem multiplicadores. Mas um ponto será sempre comum: a independência.
Essa característica, inclusive, deve ser levada em seu sentido mais amplo, considerando aspectos como linha de reporte, orçamento e, sobretudo, independência para atuação, e explicamos: quanto maior a autonomia, maior a chance de o gestor de conformidade fazer o que tem que ser feito, sem se preocupar com represálias, garantindo a obediência às leis e normas internas da empresa.
Nesse sentido, por muito tempo estruturas de conformidade ou programas de compliance foram pensados e idealizados dentro do departamento jurídico ou de recursos humanos, mas não demorou a aparecer situações em que alguém desse ou daquele departamento estava conflitado para proceder à análise de uma denúncia, por exemplo.
Ou o gestor de conformidade tinha que analisar uma recomendação legal dada pelo Jurídico, ou uma sanção imposta pelo RH em determinado evento, e ficava receoso em tomar providências contra seu superior ou contra o departamento em que estava inserido.
Da mesma forma, a independência financeira auxilia sobremaneira na amplitude e profundidade da execução de ações típicas de compliance, como aquelas dedicadas à prevenção, detecção e correção de não conformidades.
Ter seu próprio orçamento, baseado nas reais necessidades da empresa, sem depender de outras áreas ou sem concorrer com elas, é indispensável para que conformidade não fique à míngua e dependente de sobras de orçamento.
E mais: aquele pedido de ajuste de gastos para se bater essa ou aquela meta não deve interferir no orçamento de conformidade. De janeiro a dezembro, ele pode aumentar, mas sofrer cortes jamais.
Por fim, mas não menos importante, temos o aspecto da linha de reporte: com estrutura e funcionamento independentes de qualquer outra área, responder a um colegiado é a melhor solução.
O reporte de não conformidades para uma só pessoa é um grande risco, e pode colocar tudo a perder. Figuras como o diretor jurídico, financeiro, de recursos humanos ou até mesmo o presidente da empresa foram, e ainda são, comuns em algumas estruturas como sendo o ponto máximo de reporte. Mas não é o ideal.
A situação envolvendo o afastamento do presidente da Caixa Econômica Federal por denúncias de assédio exemplifica o que foi dito: em comunicado recente, o banco informou que a Corregedoria, antes ligada à presidência da instituição, passou a reportar ao Conselho de Administração.
A mudança, segundo o comunicado, teria por objetivo “reforçar a autonomia e isonomia da corregedoria”, antes subordinada ao ex-presidente afastado. Denúncias teriam sido realizadas, mas restaram sem a devida investigação pelo banco, possivelmente por conta dessa relação direta.
Por situação semelhante passou a Petrobrás, após sucessivos eventos que colocaram em xeque o real funcionamento e eficácia de sua estrutura de conformidade. A independência e visão compartilhada do todo passaram a ser padrão.
E não raras as vezes os órgãos colegiados, que respondem a acionistas e proprietários, têm uma posição superior à dos executivos que ocupam as cadeiras de um C-level, por exemplo, inclusive contando com profissionais de mercado, externos, não colaboradores, o que reforça a ideia de independência.
Assim, além da composição por mais de uma pessoa, o que por si tende a afastar a inércia, como visto na CEF, a multidisciplinariedade é igualmente recomendável, e não só em relação a departamentos/áreas envolvidas, mas em senioridade também.
Cinco, seis, sete pessoas, de diferentes áreas, com diferentes experiências de vida e profissionais, e em diferentes momentos de suas carreiras, certamente tomarão decisões mais acertadas e conduzirão melhor assuntos por vezes graves e delicados do que uma só pessoa.