Neste artigo você encontrará as seguintes informações:
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- O que são prêmios e qual sua natureza jurídica após a MP 905/2019.
- Necessidade de revisitar a política de prêmios a partir de agora.
- O que muda no regime de contribuições previdenciárias.
- Data de vigência da MP 905/2019.
1. Contexto político e legislativo.
Em 11 de novembro de 2019, foi editada a Medida Provisória nº 905/2019 (MP 905), que institui o Contrato de Trabalho Verde e Amarelo, assim como altera a legislação trabalhista, e oferece outras providências.
A MP 905 é editada em decorrência da vigência da Lei nº 13.874/2019, que instituiu a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e estabeleceu normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica, além de disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador.
Esta MP 905 vem ao mundo jurídico nominada como segunda Reforma Trabalhista, considerando que a Lei nº 13.467/2017 foi tida como o primeiro movimento de Estado na direção de uma desregulamentação das normas trabalhistas no ordenamento jurídico brasileiro contemporâneo.
2. Os prêmios e sua natureza jurídica com a Lei nº 13.467/2017 – Primeira Reforma Trabalhista.
A doutrina sempre apontou a natureza salarial dos prêmios, considerando o caráter retributivo vinculado à conduta individual ou coletiva dos trabalhadores. Destacavam-se os prêmios como modalidade de salário-condição, de sorte que a parcela não seria paga nos meses em que não fosse verificada a ocorrência do fato gerador.
Porém, a Reforma Trabalhista da Lei nº 13.467/2017 trouxe algumas mudanças nos aspectos remuneratórios, o que demandou uma releitura do tema relativo aos prêmios, especialmente em consideração à nova redação do art. 457, § 2º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Segundo o art. 457, § 2º da CLT, dentre outras parcelas ali previstas, “os prêmios e abonos não integram àa remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário”.
Além de estabelecer que os prêmios não ostentam natureza salarial, a Lei nº 13.467/2017 cuidou de dar seu conceito. Assim, o art. 457 da CLT, em seu parágrafo quarto, dispôs que “consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a um empregado ou a um grupo de empregados, em razão a um desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades”.
Embora tenha afastado expressamente a natureza salarial dos prêmios, o art. 457, § 4º da CLT foi claro no sentido de que depende do (i) ato de liberalidade do empregador, estando (ii) condicionado ao desempenho superior ao ordinário.
Diante desse quadro, a Receita Federal do Brasil firmou seu posicionamento através da Solução de Consulta COSIT Nº 151, de 14 de maio de 2019, exatamente no sentido de que a instituição de prêmios por ajuste expresso descaracteriza a condição de liberalidade. Dessa forma, a parcela passa a sofrer incidência de contribuições previdenciárias.
A Solução de Consulta COSIT Nº 151 da Receita Federal do Brasil atinge diretamente as negociações coletivas que estabelecem políticas de prêmios. Mais que isso, ignora que a própria Constituição Federal garante a autonomia privada dos entes coletivos, através de seu art. 7º, XXVI.
Também há ofensa ao art. 611-A, V, VI e IX da CLT, que consagra a prevalência do negociado sobre o legislado em matéria de planos de cargos e salários, regulamento empresarial, remuneração por produtividade e prêmios.
Em idêntico sentido, o art. 611-B da CLT não veda a possibilidade de negociação coletiva acerca da natureza dos prêmios, previsão que encontra ressonância na Orientação Jurisprudencial 413 da Subseção de Dissídios Individuais I do Tribunal Superior do Trabalho no tema da alimentação, editada já em 2012.
Assim, não poderia a Receita Federal do Brasil regular da forma como regulou na Solução de Consulta COSIT Nº 151, pois, uma vez determinado por lei e também por negociação coletiva que o prêmio não ostenta natureza salarial, a contribuição previdenciária, acessória que é, deve seguir a sorte do principal, tal como estabelece o art. 92 do Código Civil.
Como visto, os prêmios não ostentam natureza jurídica salarial já na Primeira Reforma Trabalhista de 2017.
3. Os prêmios e sua natureza jurídica com a MP 905/2019 – Segunda Reforma Trabalhista.
Como a definição da natureza jurídica dos prêmios pela Lei nº 13.467/2017 gerou grande repercussão e insegurança jurídica, cuidou a MP 905/2019 de acrescentar o art. 5º-A na Lei nº 10.101/2000 – Lei de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) -, para deixar claro quais formas de instituição de prêmios são válidas.
Nesse sentido, a MP 905 autoriza a fixação de prêmios mediante instituição por ato unilateral do empregador e por ajuste direto com o empregado ou grupo de empregados; que o desempenho ordinário seja previamente definido e que as regras de pagamento sejam estabelecidas antecipadamente, com distribuição limitada a quatro vezes no mesmo ano civil e, no máximo, de um mês no mesmo trimestre.
Com essa autorização de prévio ajuste acerca dos prêmios, cai por terra a Solução de Consulta COSIT Nº 151 da Receita Federal do Brasil, de modo que não poderá mais o órgão federal exigir contribuições previdenciárias quando a parcela tiver sido ajustada previamente pelo empregador ou por meio de negociação coletiva.
Assim, a MP 905/2019 traz elementos que atestam a natureza jurídica indenizatória dos prêmios, os quais somente serão tidos como salariais se desgarrados dos critérios elencados no art. 457 da CLT e no art. 5º-A da Lei nº 10.101/2000 (Lei da PLR), a saber:
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- As regras para a percepção do prêmio devem ser estabelecidas previamente ao pagamento;
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- Liberalidade para a sua instituição, a qual não se descaracteriza pela fixação prévia do desempenho esperado e delimitação das regras para percepção;
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- Desempenho superior ao esperado, avaliado discricionariamente pelo empregador, desde que o desempenho ordinário tenha sido previamente definido;
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- Sejam pagos, exclusivamente, a empregados, de forma individual ou coletiva;
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- O pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores limitado a quatro vezes no mesmo ano civil e, no máximo, de um mês no mesmo trimestre.
4. Necessidade de revisitar as políticas de salário e programas de compliance. Incidência de contribuição previdenciária.
A partir da vigência da MP 905/2019, será fundamental efetuar uma revisão nas políticas de salários das empresas, considerando que o regramento mudou sensivelmente e que a não observância dessa nova normativa poderá acarretar o reconhecimento da natureza salarial dos prêmios pagos em desconformidade, com incidência de contribuições previdenciárias.
Nesse aspecto, a mera desconformidade apontada atrai a Solução de Consulta COSIT Nº 151 da Receita Federal do Brasil, assim como pode ser reconhecida a natureza salarial dos prêmios pela Justiça do Trabalho, em razão da primazia da realidade que encontra fundamento nos artigos 9º e 444 da CLT.
Importante realçar, também, o dever de guarda das regras que disciplinam o pagamento dos prêmios por seis anos, contados da data do pagamento, nos termos do art. 5º-A, V da Lei nº 10.101/2000 (Lei da PLR).
5. Vigência da MP 905/2019 exclusivamente quanto aos prêmios.
A MP 905/2019 foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 12/11/2019 e trouxe consigo diversos prazos de vigência, conforme a matéria regulada.
No entanto, o regramento relativo aos prêmios teve vigência imediata em 12/11/2019, como estabelecido em seu artigo 53, inciso terceiro.
6. Conclusão.
A julgar pelo que foi noticiado do contexto político para a edição da MP 905/2019, pode-se considerar que parte significativa de seu texto poderá ser convertida em lei pelo Congresso Nacional, no prazo de 60 (sessenta) dias, prorrogável por mais 60 (sessenta) dias, de acordo com o estabelecido pelo art. 62, § 3º da Constituição Federal.
Caso assim não ocorra, as relações mantidas durante o prazo de sua vigência serão disciplinadas pelo Congresso Nacional, mediante decreto legislativo.
Destacamos que a presente MP 905/2019 representa mais um passo na direção de uma desregulamentação e simplificação das leis trabalhistas, de valorização da livre iniciativa e da liberdade econômica, além da paulatina retirada do Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica.
Por fim, orientamos ao leitor que proceda com a adequação de sua política premiatória, pois, a julgar pela desconformidade em relação à nova regra, poderá se deparar com o reconhecimento da natureza salarial da parcela, com incidência de encargos trabalhistas e previdenciários indesejados.