Governança, sucessão e conflitos: desafios para empresas familiares

Atualmente, as empresas familiares têm sido pilares essenciais da economia brasileira, representando uma parcela significativa das sociedades ativas no país.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 90% das empresas no Brasil têm um perfil familiar, sendo certo que estas contribuem significativamente para a geração de riqueza e emprego, pois são responsáveis por mais da metade do Produto Interno Bruto (PIB) do país e, além disso, empregam aproximadamente 75% da mão de obra nacional.

Porém, de acordo com uma pesquisa feita pela PwC, apenas 36% das empresas familiares seguem para a segunda geração. Para a terceira geração, remanescem somente 19% e, para a quarta, o número cai drasticamente para 7%.

Diante desses dados, considerando a importância das empresas familiares no contexto nacional, nota-se a necessidade de que esses tipos de instituições sejam devidamente assessorados, para garantir, principalmente, a longevidade de suas operações.

Até porque, quando analisadas as questões contenciosas sobre o tema, hoje abarcadas pelo judiciário brasileiro, observa-se que os Tribunais têm dado enfoque às características específicas das empresas familiares para fins de resolução de conflitos, a depender do tipo de sociedade formada.

Isso porque, como se sabe, as relações entre os acionistas e os administradores são extensivamente mais fortes nas empresas familiares, em comparação a outras espécies de companhias, fator este que influencia nas questões relacionadas ao próprio vínculo societário e, consequentemente, até mesmo no procedimento e nos requisitos para uma possível dissolução de sociedade.

O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu, no REsp 1.400.264/RS, a possibilidade jurídica da dissolução parcial de sociedade anônima fechada, pela quebra de affectio societatis, nos casos em que o liame subjetivo entre os sócios for preponderante.

No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao julgar a apelação autuada sob o nº 1014153-80.2020.8.26.0564, entendeu que, em se tratando de sociedade anônima fechada com caráter de empresa familiar, constituída como holding, em que predomina o relacionamento entre os sócios, é possível a dissolução ante o reconhecimento da perda do liame subjetivo. Segundo o relator do caso, a desarmonia entre os integrantes da empresa seria um entrave à consecução de seu objeto social.

Vale lembrar, porém, que esse entendimento não é unânime e tem sido aplicado especificamente às sociedades anônimas fechadas, que muito se diferem das sociedades anônimas abertas e das sociedades limitadas.

Também no contexto de empresas familiares, considerando a prática comum de expansão dos negócios pelos membros da mesma família, os Tribunais têm entendido, já há algum tempo, sobre a possibilidade de desconsideração inversa da personalidade jurídica da sociedade devedora, justamente para que se possa atingir o patrimônio das demais empresas pertencentes ao mesmo grupo.

Segundo o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento do agravo de instrumento nº 2287237-25.2021.8.26.0000, esse tipo de medida pode ser adotado em se tratando de “empresas com quadros societários compostos por integrantes da mesma família, atuando como holdings, com nítido escopo de administrar bens próprios e participações no capital das empresas que compõem o grupo econômico familiar.”

Portanto, contar com um planejamento patrimonial e sucessório e, ainda, com uma assessoria contenciosa sobre o tema é fundamental para garantir a longevidade das sociedades familiares, evitando, assim, o surgimento de conflitos que possam prejudicar as atividades empresariais.

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