LEI DO FGTS ALTERADA: PAGAMENTO DIRETAMENTE AO TRABALHADOR É CONSIDERADO NÃO QUITADO E É VEDADA SUA CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA

 


Neste artigo você encontrará as seguintes informações:

      •  A Lei do FGTS foi alterada em 11/12/2019.
      •  O FGTS pago diretamente ao trabalhador é considerado como não quitado.
      •  O FGTS não depositado não é passível de indenização compensatória.
      •  Acordos trabalhistas judiciais e extrajudiciais se sujeitam à nova regra.

 

1. A Lei do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) foi alterada em 11/12/2019 pela Lei nº 13.932/2019

No dia 11 de dezembro de 2019 foi sancionada a Lei nº 13.932/2019, que alterou o ordenamento jurídico nacional relativo ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para instituir, entre outras inovações, a modalidade de saque-aniversário dos depósitos existentes na conta vinculada do trabalhador.

Houve uma farta exposição na mídia acerca do saque-aniversário, da movimentação das contas do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP), além da extinção da contribuição de 10% (dez por cento) devida pelos empregadores em caso de despedida sem justa causa.

Porém, uma sensível alteração operada na Lei nº 8.036/90 (lei geral do FGTS) passou despercebida em razão de temas mais impactantes para a economia, mas que não diminui sua relevância. Estamos falando sobre os depósitos do FGTS pagos diretamente ao trabalhador, tema que detalharemos a seguir.

 

2. O FGTS pago diretamente ao trabalhador na nova redação da Lei nº 8.036/90 (lei geral do FGTS)

O art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.036/90 estabelece que o juiz determinará que a empresa sucumbente proceda ao recolhimento imediato das importâncias devidas a título de FGTS, seja nas ações ajuizadas para ressarcimento das parcelas relativas ao Fundo, seja nas que, direta ou indiretamente, impliquem essa obrigação de fazer.

Na prática forense trabalhista, observamos um sem-número de acordos judiciais em que as parcelas do FGTS, direta ou indiretamente devidas, são pagas diretamente ao trabalhador, sem realizar o recolhimento dos valores pelo procedimento estabelecido pelo art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.036/90.

Embora essa prática seja conhecida em acordos judiciais e extrajudiciais, o pagamento direto ao trabalhador está em desacordo com a lei e há decisões judiciais nesse sentido, inclusive de forma mais uniforme no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Agora, com a vigência da Lei nº 13.932/2019, a partir de 12/12/2019, foi inserido o art. 26-A na Lei nº 8.039/90, que aperta o cerco contra o pagamento do FGTS diretamente ao trabalhador, estabelecendo o seguinte:

 

Art. 26-A. Para fins de apuração e lançamento, considera-se não quitado o valor relativo ao FGTS pago diretamente ao trabalhador, vedada a sua conversão em indenização compensatória. (Incluído pela Lei nº 13.932, de 2019)

 

Sem adentrar na discussão sobre a constitucionalidade da norma no ponto em que não reconhece o pagamento irregular pelo empregador, destacamos que a vontade do legislador pátrio foi clara no sentido de que somente o depósito na conta vinculada do trabalhador no FGTS quita a obrigação, sendo vedada a conversão da obrigação em indenização compensatória.

Assim, duas situações passam a reger os depósitos do FGTS com a vigência da Lei nº 13.932/2019 e do art. 26-A da Lei nº 8.036/90:

 

Considera-se não quitado o valor relativo ao FGTS pago diretamente ao trabalhador.

É vedada a conversão do FGTS não depositado em indenização compensatória.

 

3. A partir de 12/12/2019, os acordos judiciais e extrajudiciais trabalhistas se sujeitam à nova regra de não quitação em caso de pagamento direto ao trabalhador. Vedada também a conversão em indenização compensatória.

A partir da vigência do art. 26-A da Lei nº 8.036/90, em 12/12/2019, os acordos judiciais e extrajudiciais trabalhistas se sujeitam à nova regra de não quitação em caso de pagamento direto ao trabalhador.

Ainda, previu o novel art. 26-A da Lei nº 8.036/90 que é vedada a indenização compensatória. Isso significa que não poderá o juiz converter a obrigação não cumprida em indenização compensatória do montante devido, pois o legislador quis preservar o sistema de recolhimento obrigatório do FGTS junto à Caixa Econômica Federal (CEF).

Como já explanado, a Justiça do Trabalho vinha dividida quanto ao tema da invalidade dos pagamentos putativos, ainda antes da vigência da Lei nº 13.932/2019, valendo destacar o evidente risco de enriquecimento indevido do trabalhador que já recebeu de boa-fé o valor dos depósitos devidos, situação vedada pelo art. 884 do Código Civil, que trata do enriquecimento sem causa.

No mesmo sentido, está na decisão de abril de 2019, proferida pelo Tribunal Regional da 4ª Região (RS), a seguinte informação:

 

RECURSO ORDINÁRIO DA UNIÃO. AÇÃO ANULATÓRIA DE AUTO DE INFRAÇÃO. PAGAMENTO DIRETO DOS VALORES DE FGTS AUTORIZADO POR AÇÃO JUDICIAL. Embora a Lei nº 8.036/90 não autorize o pagamento direto do FGTS ao trabalhador, não há como a autoridade fiscalizadora deixar de efetuar o abatimento de tais valores comprovadamente pagos diretamente aos empregados, conforme autorizado por meio de ação judicial. Tendo em vista o princípio básico do direito administrativo, inexiste convalidação de ato administrativo que contém nulidade insanável, como na hipótese, o que, por essa razão, resulta em sua invalidade. Apelo não provido. (TRT-4 – RO: 00201610920185040731, Data de Julgamento: 10/04/2019, 5ª Turma)

 

Sem aprofundar nesse aspecto, é importante destacar que o risco de ser obrigado a pagar novamente (recolher) o valor dos depósitos do FGTS, caso tenha sido pago diretamente ao trabalhador, passa a ser real com a vigência do art. 26-A da Lei nº 8.036/90.

Com esse novo substrato jurídico, terá a fiscalização do FGTS um maior vigor e renovada energia para autuar e multar as empresas que não tenham procedido conforme a regra do art. 26 da Lei nº 8.036/90, com potencial de aumento do passivo trabalhista e ajuizamento de execuções fiscais na Justiça do Trabalho (se decorrentes de ações trabalhistas em que o pagamento se deu de forma direta ao trabalhador).

Por fim, entendemos que os processos de jurisdição voluntária para homologação de acordos extrajudiciais, previstos pelo art. 855-B e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), não fogem a essa regra, o que demanda atenção nos casos em que acordado pelas partes o pagamento direto do FGTS ao trabalhador. Vide o caso do seguinte processo que tramitou na 75ª Vara do Trabalho de São Paulo: processo nº 1000455-61.2018.5.02.0075.

 

4. Conclusão.

Desde 1988, se constata uma ampliação do caráter de disponibilidade dos valores presentes nas contas do FGTS. Isso se deve pelos baixos níveis de rendimento do Fundo, com incidência apenas da TR + juros de 3% ao ano, cálculo que não reflete sequer a inflação.

Os dados da Caixa Econômica Federal de 2014 apontam que, a cada 10 minutos, 1000 pessoas sacam o FGTS. Por mês, aproximadamente 3,5 milhões de trabalhadores sacam o Fundo. Ao longo de um ano, 40 milhões de empregados retiram o FGTS. Isso evidencia a vocação do FGTS para um sistema de garantia remuneratória individual.

Atualmente, a legislação permite mais de 30 modalidades de saque, o que estampa que o Fundo, paulatinamente, vem assumindo feição de garantia monetária, garantia de empréstimos consignados e até para a transferência de recursos da conta do titular do FGTS para a aquisição de ações.

Sob essa ótica, o novo art. 26-A da Lei nº 8.036/90 vem ao ordenamento jurídico com nítido viés restritivo e desestimulante à facilitação e simplificação dos pagamentos decorrentes de acordos, sejam eles judiciais ou os extrajudiciais levados à homologação pelo procedimento de jurisdição voluntária do art. 855-B e seguintes da CLT.

Diante desse quadro vigente desde 12/12/2019, é fundamental atuar com os olhos voltados para a minimização dos riscos possíveis em razão de pagamentos do FGTS feitos diretamente ao trabalhador, considerando que é indesejável ser posteriormente obrigado a depositar a mesma quantia já adiantada diretamente no acordo judicial ou extrajudicial.

 

 

 

MAURICIO GASPARINI
mauricio.gasparini@fius.com.br

 

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