Diante do risco de desvio de uso de alguns produtos químicos, a Polícia Federal, o Ministério do Exército e a Polícia Civil passaram a controlar a utilização, a comercialização e a armazenagem de alguns desses produtos.
De acordo com a Lei nº 10.357/2001, a Polícia Federal é responsável pelo controle e fiscalização de todos os produtos químicos que possam ser utilizados como insumo na elaboração de substâncias entorpecentes, psicotrópicas ou que determinem dependência física ou psíquica. Sendo assim, o órgão é responsável pela concessão de Certificado de Registro Cadastral e Certificado de Licença de Funcionamento, com validade de um ano, para as atividades de fabricação, produção, armazenamento, transformação, embalagem, compra, venda, comercialização, aquisição, posse, doação, empréstimo, permuta, remessa, transporte, distribuição, importação, exportação, reexportação, cessão, reaproveitamento, reciclagem, transferência e utilização.
A exigência alcança não só a empresa fornecedora do material, como também o transportador e o comprador deste produto. Isto porque, a responsabilidade envolve toda a cadeia que utiliza e/ou manuseia produtos químicos controlados.
Vale mencionar situações que, muito embora a empresa adote posturas proativas de controle de seus produtos químicos, acabe comprando de um fornecedor ou transportador que não têm a devida licença. Ou, no caso, o fornecedor ou transportador têm a licença para alguns produtos, mas não para o produto efetivamente vendido ou transportado. Por exemplo, determinada empresa usa em seu processo produtivo o produto ácido clorídrico e realiza a compra desse produto. Ao solicitar a licença da Polícia Federal ao vendedor ou ao transportador, estes apresentam uma licença. Ocorre que não vêm discriminados na licença da Polícia Federal os produtos autorizados pelo órgão, e, a empresa, não se preocupa em consultar a lista de produtos controlados autorizados. Assim, essa empresa poderá comprar o produto ácido clorídrico de empresa não autorizada para vendê-lo ou transportá-lo. Portanto, ainda que a empresa esteja autorizada para venda de clorofórmio e ácido sulfúrico, não está para o ácido clorídrico, o que enseja a irregularidade e a aplicação de penalidades, inclusive para a empresa compradora do produto.
Em um primeiro momento, pode-se entender que este problema não diz respeito a quem compra, mas apenas a quem vende ou transporta de maneira irregular. No entanto, como a responsabilidade é compartilhada pela cadeia e atinge a pessoa jurídica além da pessoa física, a empresa, ainda que agindo de boa fé, seus representantes legais podem responder criminalmente por fabricação e tráfico de entorpecentes, formação de quadrilha – diante da participação de três ou mais agentes, dentre outros crimes, dependendo do caso fático.
Outro problema é o desvio de pequenas quantidades de produto químico controlado quando da entrega do produto na empresa compradora. Quando do recebimento do produto, muitas vezes por caminhão tanque, um litro pode ser facilmente desviado. Igualmente, neste caso, ainda que os dirigentes não saibam e não corroborem com esta prática, poderão responder criminalmente em conjunto com o infrator.
Sabe-se que os produtos mais visados pela Polícia Federal atualmente são a cafeína e a lidocaína, utilizadas na fabricação da cocaína. Neste sentido, o órgão tem trabalhado, inclusive, para incluir neste controle as farmácias de manipulação, que hoje não prestam informação da venda de suas manipulações. Muito embora o farmacêutico ache estranho um pedido de 200 cápsulas/mês de cafeína, acaba entregando o pedido ao cliente para não perder a venda, pois sabe que se não vender outra farmácia o fará. No entanto, muito provavelmente, esta farmácia está colaborando com o tráfico de entorpecentes. A ação da Polícia Federal é justamente no sentido de coibir essas vendas e controlar o destinatário desses produtos. Neste caso, sendo identificada a venda do produto para fabricação de entorpecentes, o farmacêutico responsável, bem como o dono da farmácia responderão por fabricação, tráfico e, possivelmente, formação de quadrilha.
Existe ainda o risco para os produtos químicos controlados provenientes da Bolívia, do Peru e do Paraguai, quanto à regularidade dos mesmos. Tanto que existe controle específico no caso de importação e exportações com esses países.
Além das irregularidades já citadas, também configuram infração (i) deixar de cadastrar-se ou licenciar-se no prazo legal; (ii) deixar de comunicar, no prazo de trinta dias, qualquer alteração cadastral ou estatutária, bem como a suspensão ou mudança de atividade sujeita a controle e fiscalização; (iii) deixar de apresentar, quando solicitado, notas fiscais, manifestos e outros documentos de controle; (iv) deixar de informar qualquer suspeita de desvio de produto químico controlado, para fins ilícitos; (v) omitir as informações ou prestá-las com dados incompletos ou inexatos; (vi) exercer qualquer das atividades sujeitas a controle e fiscalização, sem a devida Licença de Funcionamento ou Autorização Especial; (vii) exercer atividade sujeita a controle e fiscalização com pessoa física ou jurídica não autorizada ou em situação irregular; (viii) importar, exportar ou reexportar produto químico controlado, sem autorização prévia; (ix) alterar a composição de produto químico controlado, sem prévia comunicação ao órgão competente; (x) adulterar laudos técnicos, notas fiscais, rótulos e embalagens de produtos químicos controlados visando a burlar o controle e a fiscalização; (xi) deixar de informar a concentração do produto químico controlado constante do laudo técnico ou da nota fiscal, em local visível da embalagem e do rótulo; (xii) deixar de comunicar ao Departamento de Polícia Federal furto, roubo ou extravio de produto químico controlado e documento de controle, no prazo de quarenta e oito horas; e (xiii) dificultar, de qualquer maneira, a ação do órgão de controle e fiscalização.
As penalidades aplicadas vão desde advertência formal, apreensão do produto químico encontrado em situação irregular, suspensão ou cancelamento de licença de funcionamento, revogação da autorização especial, além da aplicação de multa que pode variar de R$ 2.128,20 (dois mil, cento e vinte e oito reais e vinte centavos) a R$ 1.064.100,00 (um milhão, sessenta e quatro mil e cem reais), dependendo da gravidade do fato.
Outra questão importante a ser observada é que os documentos junto a Polícia Federal (Mapas, Licenças e CR) devem ser arquivados pelo prazo de 5 (cinco) anos, podendo ser solicitado este histórico pelo órgão.
Além disso, vale lembrar que devem ser entregues os mapas mensais referentes aos produtos controlados utilizados durante o mês até o 10º dia útil do mês subsequente, sob pena de aplicação das penalidades acima citadas.
No tocante aos produtos controlados pelo Ministério do Exército, o Regulamento R-105, aprovado pelo Decreto 3.665/2000 estabeleceu a responsabilidade pela fiscalização de produtos explosivos, abrangendo principalmente munições, armas de fogo, artifícios pirotécnicos e outros do mesmo gênero.
Portanto, todo empreendimento que faça uso de produtos controlados pelo Exército deve obter o Certificado de Registro, com validade de até 3 (três) anos.
Algumas das infrações elencadas na norma supracitada são: (i) depositar produtos controlados em local não autorizado pelo Exército ou em quantidades superiores às permitidas; (ii) proceder à embalagem de produtos controlados, em desacordo com as normas técnicas; (iii) deixar de cumprir compromissos assumidos junto ao SFPC – Serviço de Fiscalização de Produtos Controlados; (iv) comprar, vender, trocar ou emprestar produtos controlados, sem permissão da autoridade competente; (v) cometer, no exercício de atividades envolvendo produtos controlados, quaisquer irregularidades em face da legislação em vigor; (vi) exercer atividades com produtos controlados sem possuir as devidas licenças de outros órgãos ligados ao exercício da atividade; (vii) exercer atividades de transporte, colecionamento, exposição, caça, uso esportivo e recarga, em desacordo com as prescrições deste Regulamento e normas emitidas pelo Exército; (viii) deixar de providenciar a renovação do registro nos prazos estabelecidos e continuar a trabalhar com produtos controlados; (ix) deixar de solicitar o cancelamento do registro quando parar de exercer atividades com produtos controlados; (x) importar, sem licença prévia, produtos controlados; (xi) importar produtos controlados em desacordo com a licença prévia; (xii) exportar, sem licença prévia, produtos controlados; (xiii) exportar produtos controlados em desacordo com a licença prévia; (xiv) atuar em atividade envolvendo produtos controlados que não esteja autorizado, ou de forma que extrapole os limites concedidos em seu registro; e (xv) outras infrações ao presente Regulamento e às normas complementares, não capituladas nos incisos anteriores.
As penalidades aplicadas são: advertência; multa simples; multa pré-interditória; interdição; e cassação de registro, com a suspensão definitiva das atividades da empresa.
Além disso, a empresa deve protocolizar trimestralmente os mapas de produtos controlados pelo Exército utilizados durante o período até o 10º dia útil subseqüente ao trimestre em questão, juntamente com as Guias de Tráfego dos produtos.
A Polícia Civil normatiza os processos para obtenção de Licença e Certificado de Vistoria para fabricação, importação e exportação, comércio, depósito, manipulação, transporte e uso de matérias explosivas, inflamáveis, armas, munições e produtos químicos agressivos ou corrosivos.
A Polícia Civil concede anualmente a Licença/Alvará de Funcionamento com validade até 31.12, devendo ser renovada até 28.02 do ano subsequente. Além da Licença/Alvará de Funcionamento, é necessário solicitar o Certificado de Vistoria com validade de 3 (três) anos.
Referido Certificado deverá ser alterado sempre que as quantidades de produtos químicos controlados utilizados pela empresa se alterarem. Caso tal informação esteja incorreta, inclusive a quantidade informada em estoque do produto, em vistoria pelos agentes da Polícia Civil, a empresa poderá se surpreender com a instauração de um Inquérito Criminal diante da divergência na informação, sendo tal divergência considerada crime.
Outra obrigação é a apresentação dos Mapas trimestrais até o 10º dia útil do mês subsequente ao trimestre sobre as operações ocorridas no trimestre, juntamente com a Guia de Tráfego do produto.
As infrações e as penalidades são as mesmas aplicadas pelo Ministério do Exército, já que a norma base para fiscalização é utilizada por ambos os órgãos.
Um problema constante verificado junto ao Ministério do Exército e à Polícia Civil diz respeito ao controle das misturas e soluções que contenham produtos químicos controlados. Isto porque, muitas vezes a norma não indica a quantidade mínima ou concentração máxima do produto para que sua solução e/ou mistura seja controlada.
Nesses casos, muitas vezes o órgão acaba adotando a posição mais restritiva e, ainda que a mistura ou solução contenha 0,001% do produto químico considerado controlado e, ainda que de forma reversa não se consiga chegar ao produto químico original controlado, entendem por controlar tal solução ou mistura, ensejando uma obrigação muitas vezes inviável para a comercialização da referida solução ou mistura. Nesse sentido, a Polícia Federal adota legislação mais completa, uma vez que prevê concentrações máximas permitidas para o controle do produto pelo órgão.
Por fim, importante frisar a questão da responsabilidade que pode abranger as três esferas do direito: penal, administrativa e civil. Como responsáveis pelas eventuais irregularidades poderão ser arrolados na esfera criminal, as pessoas físicas e a jurídicas, direta ou indiretamente responsáveis pelo ato/fato, dentre eles o diretor, o administrador, o membro de conselho, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário, o técnico, etc.
A responsabilidade na esfera civil, por não depender de culpa, exige apenas a comprovação do nexo de causalidade entre a atividade e o potencial de dano ou dano efetivo. No mesmo sentido, a responsabilidade na esfera administrativa enseja, além da interdição/proibição da atividade, em multas severas a empresa.
Renata Franco de Paula Gonçalves Moreno