O mundo está passando por uma pandemia de repercussões históricas, ocasionada pela doença Covid-19, transmitida pelo agente conhecido como novo coronavírus. A doença afeta diretamente a saúde pública global devido ao seu alto nível de contágio, por esse motivo, governos do mundo todo estão adotando medidas de isolamento social que envolvem o fechamento mandatório de estabelecimentos comerciais que comercializam bens não essenciais, de modo a evitar aglomerações de pessoas, as quais contribuem para a disseminação do novo coronavírus.
Desse modo, essas medidas de isolamento social afetam, incidentalmente, a economia mundial, que nesse viés, pode impedir ou dificultar o cumprimento de obrigações outrora assumidas entre os indivíduos.
Com a queda na demanda e manutenção das despesas fixas mantidas com funcionários, aluguel e financiamentos, empresários, comerciantes e autônomos têm percebido o impacto financeiro das consequências trazidas pelo novo coronavírus às suas relações comerciais e, principalmente, os impactos exsurgidos nas relações contratuais firmadas antes do advento da pandemia.
Diante desse cenário, como a Teoria da Onerosidade Excessiva pode nos orientar para a solução dos conflitos surgidos, de modo a buscar restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro tido no momento da assinatura do contrato ou, em último caso, permitir a extinção contratual?
Primeiramente, precisamos entender o significado de pandemia, que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é a disseminação mundial de uma nova doença, ou seja, é a enfermidade que se espalhou por diferentes continentes com a transmissão sustentada de pessoa para pessoa.
Nessa conjuntura, e compreendendo a extensão do conflito, é notório que as relações contratuais serão, em alguma medida, atingidas por tal evento imprevisível, visto que as partes não conseguiriam prever, no momento da celebração dos contratos, o surgimento de tal fato imprevisível e suas consequências. Diante disso, é possível que o cumprimento de uma obrigação contratual se torne profundamente oneroso para uma das partes, mas não necessariamente, nesse contexto, a parte poderá fazer uso da Teoria da Onerosidade Excessiva.
A Teoria da Onerosidade Excessiva, prevista nos artigos 478, 479 e 480 do Código Civil, demanda três requisitos para a sua aplicação, quais sejam, que ocorra um fato superveniente às partes, o qual cause, ao mesmo tempo, onerosidade excessiva a uma parte e extrema vantagem para outra parte. Uma vez preenchidos tais requisitos, será possibilitado à parte prejudicada requerer a revisão contratual ou, em última medida, caso não seja possível modificar equitativamente as condições do contrato para restabelecer o seu equilíbrio econômico-financeiro, poderá ser operada a extinção do respectivo contrato.
Em um contexto de Pandemia do novo coronavírus, contudo, não necessariamente teremos o terceiro requisito necessário para aplicação da Teoria da Onerosidade Excessiva, qual seja, que haja uma extrema vantagem a uma das partes diante da ocorrência de um fato imprevisível. Isso porque, de um modo geral, e salvo alguns segmentos de negócio tais como fornecimento de bens e serviços essenciais ligados à saúde e à alimentação, a grande maioria dos ramos de negócio tem sido impactada de forma negativa com a ocorrência da imprevisível pandemia do novo coronavírus.
Portanto, é importante que se avalie, em cada caso concreto, se de fato os efeitos decorrentes da pandemia do coronavírus acarretam o desequilíbrio econômico-financeiro estabelecido entre as partes quando da formalização de cada contrato em específico, de modo que uma das partes saia em vantagem em relação a outra.
Todavia, ainda que preenchidos os requisitos para aplicação do artigo 477 e seguintes do Código Civil, relativos à Teoria da Onerosidade Excessiva, ainda vale a máxima de que as partes deverão buscar e concentrar seus esforços em resolver as disputas e controvérsias geradas pela pandemia do novo coronavírus na via extrajudicial.
Isso porque, além do fato de que não se sabe ao certo como o Judiciário se comportará para construir a jurisprudência relativa aos casos decorrentes da pandemia do novo coronavírus, é inegável que o comportamento colaborativo das partes no sentido de buscar um denominador comum via comprometimentos e concessões por ambas as partes será avaliado pelo Judiciário quando da análise do caso concreto. Inclusive, vale ressaltar que muitas vezes é mais barato iniciar tratativas extrajudiciais para manter um parceiro comercial do que buscar um novo no mercado, economizando tempo e recursos financeiros que seriam despendidos com trocas de novas propostas técnicas e comerciais e formalização de novas minutas contratuais.
TALITA ORSINI DE CASTRO GARCIA
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