Uma forma de planejamento tributário nas operações de M&A que se tornou muito comum no Brasil durante certo período foi a utilização, pelos vendedores, de estruturas com Fundos de Investimento em Participações.
Resumidamente, os sócios/acionistas controladores de empresas em vias de serem alienadas aportavam as ações das empresas alvo (objeto da venda) em fundos de investimento em participações e o fundo, que não é tributado sobre suas operações, figurava como vendedor no contrato de compra e venda das ações.
Logo, atuando como vendedor, o FIP poderia evitar o gatilho de pagamento do IR sobre o ganho de capital, que seria cobrado na alienação da empresa alvo, postergando esse custo tributário.
Em 2014, contudo, foi publicada a Lei 13.043/2014 que, na prática, desestimulou o uso dessa estrutura de planejamento tributário, obrigando que o aporte no FIP ocorresse pelo valor de mercado das ações, colocando portanto um pedágio que, muitas vezes, inviabiliza o planejamento.
Mas, muitos planejamentos ocorrem até 2014 e somente há 2 anos o CARF está iniciando julgamentos que tratam do tema.
Com casos escassos no CARF, os contribuintes que se utilizaram a estrutura dos FIPs têm enfrentado derrotas nos julgamentos e, no dia 05/06/2019, mais uma decisão desfavorável sobreveio à família Telles, na venda do ramo de cachaças da empresa Ypióca.
No Acórdão 2401-006.611, da 2ª Seção de Julgamento / 4ª Câmara / 1ª Turma Ordinária do CARF, de relatoria do Conselheiro José Luís Hentsch Benjamin Pinheiro, foi rejeitado o recurso voluntário do contribuinte, por voto de qualidade.
O planejamento objeto da decisão se deu no final de 2011 e 2012, quando o grupo controlador da Ypióca iniciou uma série de operações societárias para alocar o negócio de cachaças embaixo de uma estrutura formada por um Fundo de Investimento Multimercado e um Fundo de Investimento em Participações, previamente à alienação da empresa e, após isso, alienar a empresa ao grupo DIAGEO.
A RFB, na sua autuação contra as pessoas físicas cotistas do fundo e com imposição de multa de 150%, alegou que os fundos não cumpriram sua função efetiva como de investimento, nos moldes da regulamentação da CVM. A “função efetiva” que a RFB alegou não existir seria uma atuação efetiva dos fundos na gestão dos seus portfólios, dentre outros aspectos.
Os conselheiros do CARF identificaram que, de fato, na operação, não havia documentos e evidências que os fundos atuaram dentro das suas finalidades e, assim, entendeu que eles foram meramente interpostos na estrutura com a finalidade de ocultar os reais vendedores (membros da família Telles) e postergar o pagamento do IR sobre ganho de capital que seria devido.
Entendemos que as situações de planejamento tributário envolvendo FIPs de fato devem estar no alvo da RBF pelos próximos anos.
Mas, em que pese as decisões desfavoráveis que casos com fundos têm tido no CARF, entendemos que judicialmente os contribuintes poderão manejar argumentos focados na legalidade das operações e não em uma abordagem de “essência sobre a forma”, que a RFB tem buscado empregar e que o CARF tem aceito.
De qualquer forma, cada caso deverá ser analisado detalhadamente para mensurar os argumentos favoráveis existentes e o grau de risco envolvido, de forma que o máximo de cautela é necessária quando grupos e famílias forem optar por alienar ativos que já estão aportados em FIPs ou, em alguns casos, forem constituir novos fundos.
Bruno Marques Santo
bruno.santo@fius.com.br
Milton Schivitaro Neto
milton.schivitaro@fius.com.br