Interessante situação foi recentemente submetida à análise do Superior Tribunal de Justiça[1]: as milhas áreas, relacionadas a programa de fidelidade de companhia aérea, integram a herança em caso de falecimento do titular?
Para decidir, o STJ observou que o Regulamento do programa de milhas possuía cláusula que impedia a transferência dos pontos após a morte do seu titular.
Segundo a Corte, mencionada cláusula é válida e, ainda que o contrato seja de adesão[2], disciplinado pelo Código de Defesa do Consumidor, não pode ser considerada abusiva.
Isso porque, conforme entendimento unânime da Terceira Turma, a relação jurídica – disciplinada pelo mencionado Regulamento do Programa de Benefícios – gera obrigações tão somente para a companhia de aviação, e, por isso, o cancelamento da pontuação, após a morte do titular, não acarreta excessiva desvantagem ao consumidor, que não desembolsou qualquer quantia adicional para acumular a bonificação.
O STJ considerou, nas razões da decisão, que o consumidor não esteve obrigado a aderir ao programa de pontuação e nem estaria impedido de utilizar os serviços aéreos, se optasse por não acumular milhas. No mais, destacou que as regras estavam claras no momento da adesão.
Portanto, de acordo com o entendimento firmado na decisão, os pontos do programa de milhagem não integram a herança e podem ser cancelados após a morte do titular, afinal, mesmo sob a proteção do Direito do Consumidor, o contrato gratuito e benéfico, que gera obrigações apenas para a companhia aérea, deve ser interpretado restritivamente, ou seja, nos exatos termos das suas cláusulas.
[1] Recurso Especial n.º 1.878.651-SP, relatado pelo Ministro Moura Ribeiro à Terceira Turma do STJ em 04/10/2022.
[2] Nesse tipo de contratação as cláusulas são unilateralmente estabelecidas pelo fornecedor dos produtos ou serviços, sem que o contratante possa discutir o conteúdo de forma substantiva.