O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão recente, através do Recurso Especial (REsp) nº 1.668.390/SP, reconheceu a isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre as receitas auferidas por associação civil sem fins lucrativos a título de patrocínio para realização de eventos e congressos. Tal decisão possui relevância pois poderá impactar além do caso concreto julgado, pois reafirma o entendimento pela ilegalidade de atos infralegais que restringem a aplicação de normas legais que reduzem a carga tributária dos contribuintes.
A isenção em questão se encontra prevista no art. 14, inciso X, da Medida Provisória (MP) nº 2.158-35/2001, que define que são isentas da Cofins as receitas relacionadas às “atividades próprias” das entidades a que se refere o art. 13 da mesma MP. Entre essas entidades, se destacam, p. ex.: instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural, científico e as associações civis sem fins lucrativos; os templos religiosos; fundações de direito público ou privado; condomínios de proprietários de imóveis residenciais ou comerciais; Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e as Organizações Estaduais de Cooperativas (OEC); e instituições de educação e de assistência social.
Contudo, a Instrução Normativa (IN) nº 247/2002, instituída pela Secretaria da Receita Federal (SRF), dispõe taxativamente, em seu art. 47, § 2º, que as receitas derivadas das “atividades próprias” das entidades são: “somente aquelas decorrentes de contribuições, doações, anuidades ou mensalidades fixadas por lei, assembleia ou estatuto, recebidas de associados ou mantenedores, sem caráter contraprestacional direto, destinadas ao seu custeio e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais”, de modo a restringir o rol de possibilidades de aplicações da isenção. Destaca-se que, embora a IN nº 247/2002 tenha sido revogada, a mesma restrição se encontra atualmente no art. 23, § 1º, da IN nº 1911/2019.
No julgado em questão, tratou-se do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT), uma associação de direito privado, prestadora de atividades sem fins lucrativos, que considerou como isentas da Cofins as receitas decorrentes de: (i) cursos, palestras e conferências; e (ii) patrocínio destinado a custear a realização desses cursos. Para o Fisco, tais receitas não estariam abrangidas no rol estabelecido pela IN nº 247/2002, logo, não fariam jus à isenção. No Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região foi reconhecida a isenção sobre as receitas dos cursos, palestras e conferências. Entretanto, foi negada quanto ao patrocínio.
Já no STJ, foi revertido o julgado a favor do contribuinte. Na decisão, foi fixado que é flagrante a ilegalidade de restrição do conceito de atividades próprias (“somente aquelas decorrentes de contribuições, doações, anuidades ou mensalidades fixadas por lei, assembleia ou estatuto, recebidas de associados ou mantenedores”) trazida pela IN nº 247/2002, oferecendo interpretação excessivamente restrita à isenção prevista na MP e extrapolando o seu poder de regulamentação. Além disso, também foi citado o julgado do REsp nº 1.353.111/RS, que reconheceu a ilegalidade da vedação à contraprestação das receitas próprias de tais entidades, previsão esta também contida na IN nº 247/2002.
Logo, conclui-se que a decisão do STJ reforça o entendimento sobre a ilegalidade da regulamentação excessiva por parte de atos infralegais, como o caso de instruções normativas emitidas pela Receita Federal ou através de decretos editados pelo Poder Executivo, restringindo a aplicação de normas legais que reduzem a carga tributária dos contribuintes, como no caso em questão, da isenção da Cofins prevista na MP nº 2.158-35/2001. Assim, caso os contribuintes se deparem com uma restrição de seus direitos por esses atos infralegais, contará com os precedentes favoráveis do STJ.
NICOLAS ALVERS